quarta-feira, 24 de setembro de 2008

MAR


Costumava sonhar, como todo mundo. Ao menos achava que fosse como todo mundo, mas sentia que havia alguma coisa de diferente a respeito de meus sonhos. Ninguém entenderia, afinal, ninguém sonhava como eu. Passei a vida tentando descobrir se havia algum propósito ou significado nisso tudo. Cheguei a pensar que talvez tivesse o poder de prever o futuro, mas a verdade é que meus sonhos nunca me disseram nada claramente e ninguém parecia se interessar por eles de qualquer jeito.
Alguns eram intensos e reais demais para serem apenas sonhos comuns. Não é possível que ninguém mais sonhasse da mesma forma. Havia sonhos recorrentes e sonhos com continuação, como uma estória e ainda aqueles que pareciam iguais, mas mudavam a cada noite.
Passei a dormir cada vez mais na tentativa de entender aquilo tudo e parecia em vão. Não aprendia nada e nada mudava também, no entanto, de tanto me dedicar a sonhar, comecei a perceber certas tendências: Eles nada diziam a não ser sobre mim. Que egoísmo e narcisismo seria então me trancar num mundo onde só eu importo e tudo gira a meu redor. Quando conseguisse finalmente me entender ou me encontrar, seria tarde demais para viver, pois provavelmente teria passado a vida inteira nessa busca a não ser que descobrisse algo novo de fato,algo revelador.
Sonhava como mar frequentemente. “Sonhar com o mar: estará envolvida em uma grande mudança em breve. Pode significar grande aventura amorosa.” Não,nada disso,no meu caso,sonhar com o mar significava que não sabia de muita coisa e que provavelmente estaria envolvida em grande conflito interno.Não era um mar qualquer,era uma mar enorme,com grandes ondas que não quebram,mas te engolem num dia cinza e você não consegue mais sair. Sonhar com o mar grande é sempre cinza e frio e solitário, não importa quantas mais pessoas estejam lá. Olhava para o mar sempre com muito respeito pois sabia que não podia com ele e não importa o sonho,toda vez que havia o mar grande,sentia um aperto no peito quando acordava,como se soubesse que algo ruim estivesse para acontecer.O último em especial: havia levado meus avós à praia mesmo tendo consciência que meu avô estaria morto há muito e que minha avó não morria de amores por ele,ainda assim,estavam felizes em tons de preto,branco e cinza.Estava frio como de costume,mas ele simplesmente a pegou pela mão e a levou para o mar.Eu nada fiz,só olhei como se nada pudesse fazer,mas dado um certo tempo,me desesperei pois eles nunca mais voltaram e me senti culpada por não ter feito nada.Chorei e acordei com aquela sensação de que se algo de fato acontecer com a minha avó vou me sentir culpada de alguma forma.Ridículo!Pela ordem natural das coisas é mesmo capaz que em breve ela não esteja mais aqui e que eu nada possa fazer, mas a simples idéia de perder alguém que se ama é de fato assustadora,pior ainda,perder para o mar grande me dá a sensação de que eu nada poderia fazer mesmo,não á o que se fazer à respeito do mar grande.Talvez seja isso,talvez o mar seja a vida que é tão enorme que parece nos engolir às vezes,nos mostrando que não temos controle.Não sei.Sei que foi triste e que ele é maior que eu.Imponente.Algo com o qual não posso lidar.Por muitas vezes fui eu quem estava nas ondas,sem conseguir sair.Problemas de certo.Não posso deixar de pensar que talvez a hora da minha avó ir para o mar esteja próxima e simplesmente essa sensação de impotência diante dos fatos óbvios da vida só sirva para me mostrar que eu não sei como lidar com essas coisas tão maiores que nós.Ilusão achar que dormindo descobrira um jeito de burlar certas leis. Ao menos,foi um lindo sonho.Ela estava finalmente feliz,ou assim eu gostaria.

Nenhum comentário: